domingo, 9 de janeiro de 2011

Organizando as ideias: Ken Robinson, as massas brasileiras e o neurocientista

Reproduzo texto publicado no Blogue do Jornalista Luiz Carlos Azenha, Vi o Mundo, em 09/01/2010.



O Oliveira indicou o vídeo acima, uma palestra animada do pensador britânico Ken Robinson.

O Professor indicou o vídeo com legendas em português (é preciso acionar o CC).

A Heloisa Villela tirou o texto em inglês e traduziu para o português (assim você pode ler, se não tiver como assistir):

“Todos os países do mundo, no momento, estão promovendo reformas na educação. Existe dois motivos para isso: um é econômico. As pessoas estão tentando descobrir como devemos educar nossas crianças para que ocupem um lugar na economia do século XXI. Como fazer isso? Apesar de não conseguirmos prever como a economia vai se comportar no fim da semana que vem, como os distúrbios recentes demostraram…

A segunda é cultural. Todos os países do mundo estão tentando descobrir como podemos educar as crianças de forma que tenham uma identidade cultural e possamos passar os genes sociais das nossas comunidades ao mesmo tempo em quesão parte do processo de globalização. Como equacionamos isso?

O problema é que estão tentando atingir o futuro fazendo as mesmas coisas que faziam no passado e, no processo, alienando milhões de crianças que não vêem nenhum propósito em ir para a escola.

Quando nós fomos para a escola, fomos mantidos lá com uma estória: se você se esforçasse, fosse bem e tirasse um diploma universitário, você teria um emprego. Nossas crianças não acreditam nisso. E elas têm razão. Hoje, é melhor ter um diploma to que não ter. Mas não é mais uma garantia. Especialmente se o caminho até lá marginaliza todas as coisas que você acham que são importantes a seu respeito.

Então as pessoas dizem que é preciso elevar os padrões, como se estivessem descobrindo a pólvora. Jura? Sim, devemos. Por que rebaixaria? Ainda não me deparei com um motivo para rebaixá-los.

O problema é que o atual sistema de educação foi desenhado e concebido e estruturado para uma outra era. Foi concebido na cultural intelectual do iluminismo. E nas circunstâncias econômicas da Revolução Industrial. Antes da metade do século XVII não existia sistema público de ensino. Você podia, talvez, ser educado pelos Jesuítas, se tivesse dinheiro. Mas a educação pública, paga por impostos compulsórios, e oferecida de graça, era uma idéia revolucionária.

E muita gente era contra. Diziam: não é possível, para várias crianças de rua e filhos de trabalhadores, se beneficiar da educação pública. Eles não são capazes de aprender a ler e escrever. Por que estamos perdendo tempo com isso? O argumento foi construído sobre uma série de suposições a respeito de estruturas sociais e capacidades. Foi impulsionado por necessidades econômicas da época mas era atravessado por um modelo intelectual da mente que é, essencialmente, a visão do iluminismo sobre a inteligência.

A real inteligência consiste da capacidade para certo tipo de dedução lógica e o conhecimento dos clássicos. O que passamos a conhecer como habilidade acadêmica. Isso está encravado na genética da educação pública; de que existem dois tipos de pessoa: acadêmicas e não acadêmicas. Pessoas inteligentes e pessoas não inteligentes. E a consequência é que várias pessoas brilhantes pensam que não são porque estão sendo julgadas por esta visão particular da mente. Então, temos duas vertentes: econômica e intelectual. E a minha visão é que este modelo provocou o caos na vida de muita gente.

Foi ótimo para alguns. Algumas pessoas se beneficiaram muito deste modelo. Mas a maioria não. Ao contrário, eles sofrem disso: esa é uma epidemia moderna, mal colocada e fictícia. Essa é a praga da TDAH.

Esse é o mapa da incidência de TDAH nos Estados Unidos. O mapa da medicação. Não me levem a mal. Eu não quero dizer que não existe TDAH. Não sou qualificado para dizer isso. Sei que a grande maioria dos psicólogos e pediatras pensam que ele existe. Mas ainda é motivo de discussão. O que eu sei, de fato, é que não é uma epidemia.

Essas crianças estão sendo medicadas com a mesma frequência com que tirávamos as amígdalas. E com a mesma base esquisita e pela mesma razão: modismo médico. Nossas crianças estão vivendo no período de estímulos mais intenso da história da Terra. Estão sendo atacadas por informações e a atenção delas é exigida por todas as plataformas: computadores, Iphones, anúncios, centenas de canais de TV e são castigadas por estarem distraídas. Distraídas do que? De coisas chatas! Da escola, majoritariamente.

Me parece não ser coincidência totalmente que a incidência de TDAH cresceu paralelamente ao uso dos testes padrão. Essas crianças estão tomando Ritalina, Aderal e tantas outras coisas, normalmente drogas muito perigosas, para focarem e se acalmarem.

Mas de acordo com isso aqui, a incidência de TDAH aumenta na medida em que você viaja para o leste do país. As pessoas começam a perder o interesse em Oklahoma. Quase não conseguem mais pensar direito em Arkansas. E quando chegam a Washington já enlouqueceram (e acredito que existem diferentes razões para isso!).

É uma epidemia fictícia. Se você pensar sobre isso, as artes, e não apenas as artes mas a ciência e a matemática também, mas falo das artes porque são a principal vítima dessa mentalidade corrente.

As artes lidam, especialmente, com a idéia da experiência estética. Na experiência estética, seus sentidos estão operando no pico. Você está presente no momento, quando está envolvido com essa experiência que está vivendo, quando está completamente VIVO. O anestésico é quando desliga seus sentidos. E se mata para o que está acontecendo. E muitas dessas drogas são isso. Nós estamos fazendo com que as crianças enfrentem o processo educacional anestesiando-as. E acho que deveríamos estar fazendo justamente o oposto. Não devíamos adormecê-las e sim acordá-las para o que têm dentro delas mesmas.

Mas o modelo que temos é o seguinte: um sistema de educação moldado pelos interesses do industrialismo e a semelhança dele. Lhes dou alguns exemplos:

As escolas estão organizadas como linhas de montagem. O sino toca, áreas separadas, especialidades que não se interconectam. Ainda educamos as crianças em fornadas. Entram no sistema pela idade. Por que? Por que essa suposição de que o que têm em comum é a idade?

A coisa mais importante é a data de fabricação?

Eu conheço crianças que são muito melhores que outras, da mesma idade, em algumas disciplinas.

Ou em diferentes horários do dia. Ou melhores em grupos pequenos e não grandes. As vezes, preferem ficar sozinhas. Se você está interessado em um modelo de aprendizagem, não começa com essa mentalidade de linha de montagem. Isso diz respeito, essencialmente, a conformidade. E aumenta com os testes padrão e o currículo padrão. Tudo é a padronização. Acho que deveríamos seguir na direção diametralmente oposta. É isso que quero dizer quando fala em mudar o paradigma.

Recentemente foi feito um excelente estudo sobre pensamento divergente. Pensamento divergente não é a mesma coisa que criatividade. Eu defino a critivade como o processo de ter idéias originais que tem algum valor. Não é sinônimo, mas é capacidade essencial para a criatividade. É a habilidade de ver várias respostas possíveis para uma pergunta. Várias maneiras diferentes de interpretar a pergunta. Pensar para os lados, não pensar de forma linear ou convergente apenas. Ver respostas múltiplas e não apenas uma.

Aqui vai um exemplo. Você pode dar quantos usos diferentes a um clips? A maioria das pessoas provavelmente vai pensar em 10 ou 15. As pessoas boas nisso podem se sair com 200. E chegam lá perguntando: o clips pode ter duzentos pés e ser feito de espuma de borracha? Ou tem que ser um clips de papel como nós conhecemos?

O teste foi feito com 1.500 pessoas em um livro chamado grandes pontos e mais além. Se você atingisse um determinado patamar, seria considerado um gênio do pensamento divergente. Minha pergunta prá vocês é essa: que percentagem dos 1.500 testados atingiu o nível de gênio do pensamento divergente?

Todos eram alunos de Jardim da Infância. 98%. Mas era um estudo longitudinal. Testaram as mesmas crianças cinco anos depois, na idade de 8 a 10 anos. E testaram novamente outros cinco anos depois, na idade de 13 a 15 anos. Aí vem o padrão. Isso conta uma estória interessante. Você poderia imaginar isso indo para em qualquer sentido. Começa não sendo muito bom mas melhor na medida em que envelhece. Mas isso mostra duas coisas: todos nós temos essa capacidade. E dois, ela quase sempre deteriora.

Agora, muitas coisas aconteceram com essas crianças enquanto elas cresceram. Mas a mais importante, estou convencido, é de que agora elas se tornaram educadas. Passaram dez anos na escola ouvindo que existe uma resposta, no verso. E não olhe, nem copie, isso é fraude. Fora da escola, isso se chama colaboração. Isso não é porque os professores querem assim. É porque aconteceu assim. Porque está na genética da educação.

Temos que pensar de forma diferente a respeito da capacidade humana. Temos que superar esse conceito antigo de acadêmico e não acadêmico. Abstrato. Teórico. Vocacional. E ver como realmente é: um mito. Em segundo lugar, temos que reconhecer que a maior parte do aprendizado acontece em grupos. Colaboração é essencial para o crescimento. Se atomizar as pessoas, separá-las e julgá-las separadamente, vamos criar uma disjunção entre elas e o ambiente natural do aprendizado.

Em terceiro lugar, é crucialmente a respeito da cultura das nossas instituições. Os hábitos das nossas instituições e os habitats que ocupam”.



O Zé Povinho trouxe (acima) uma segunda palestra desta série, que está bombando no You Tube (esta com legendas em português direto no vídeo).

Para outras vídeo-palestras da RSA, clique aqui.



O Nilton acrescentou sua colaboração (acima), que fala especificamente da deseducação continuada promovida por uma certa elite dominante.

O Jorge disse que este debate sobre educação no Brasil o faz lembrar das propostas do neurocientista Miguel Nicolelis.

Aqui, a proposta de Nicolelis para a Ciência brasileira.

Aqui, a reportagem da revista Science sobre o Brasil.

Aqui, Nicolelis pode ser candidato ao Nobel.

E devemos lembrar que a discussão toda começou por conta dos textos provocativos da Heloisa Villela sobre o transtorno do déficit de atenção.

Aqui, o primeiro.

Aqui, a resposta que o primeiro texto gerou, do médico Bruno Mendonça Coêlho.

Aqui, o segundo.

Aqui, o terceiro.

Uma discussão destas aqui no Viomundo e tem gente que prefere ler… a Veja.

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