terça-feira, 21 de dezembro de 2010

A farsa do mensalão e o linchamento de Zé Dirceu

Publicado em 03 de novembro de 2010 no Blog "A Trincheira"



Um dos golpes mais duros sofridos pelo governo Lula foi a perda de seu homem de confiança e chefe da casa civil, José Dirceu, em dezembro de 2005. Faltando menos de um ano para as eleições presidenciais de 2006, Dirceu foi cassado após ter seu nome envolvido, sem provas, no que a direita e a mídia chamaram de mensalão.
.
Fazer a defesa de Zé Dirceu não é tarefa simples, pois não houve um político, na história recente do País, que tenha passado por um processo tão grande de desconstrução da imagem como ele. Quando a maioria das pessoas pensa no Zé Dirceu, o que vem à sua mente é o corrupto, o mafioso ou o chefe de quadrilha. É dessa forma que ele foi tratado pela imprensa, afinal.

Sei que o assunto vai render polêmica. Antes de você se sentir revoltado por eu dizer que não houve o mensalão, informe-se primeiro (não vale usar os arquivos da Veja como fonte de pesquisa) e dê uma, apenas uma, prova de que o tal mensalão existiu. Acredite: não será tarefa fácil. Pra começo de conversa, defina mensalão. O que é mensalão pra você?

Segundo o ex-deputado da oposição Roberto Jefferson, o mensalão consistia em pagamentos mensais que o PT fazia aos deputados para que os mesmos votassem a favor do governo nos projetos levados à Câmara. As inúmeras investigações, porém, não encontraram nada parecido ao mensalão denunciado por Bob Jeff. Sendo assim, por ter acusado sem provas, Jefferson teve o mandato cassado.

Existiram irregularidades no governo Lula? Sim, existiram. Mas não houve nenhum mensalão. O que houve foi o uso de dinheiro de caixa 2 para pagar dívidas de campanha de políticos aliados – uma prática muito comum entre os partidos: o clássico “eu pago a tua dívida e você fica me devendo um favor lá na frente”. Trata-se de algo muito mais antiético do que propriamente criminoso.

Coibir esse tipo de negociação é praticamente impossível, mas você pode criar mecanismos que a inibam. O presidente Lula, por exemplo, tentou propor uma reforma política. Tal reforma defende o financiamento público de campanhas políticas (o que impediria o uso de dinheiro sujo ou não declarado), fidelidade partidária (proibição da conveniente troca de siglas), fim das coligações proporcionais (o que evitaria a eleição de candidatos nanicos que acabam pegando carona no sucesso dos Tiriricas da vida) etc.

A reforma política seria o primeiro passo. Lula chegou a mandar este projeto ao Congresso, mas ele não saiu do papel. Adivinha quem foi contra? Sim, eles, os arautos da ética e da moralidade. PSDB, DEM e a ala conservadora do PMDB se uniram e impediram que fosse votado. Os políticos que fingem revolta quando falam no mensalão são os mesmos que não querem a reforma política. Muito estranho, não acham?

Zé Dirceu teve seu nome injustamente envolvido na farsa armada pelo PSDB e pelo DEM, tendo Roberto Jefferson cumprido a função do boi de piranha, ou seja, do que vai à frente para ser imolado, sacrificando-se em nome do grupo. Tudo saiu como a oposição queria: mesmo cassado por fazer uma acusação sem provas, Bob Jeff levou consigo Zé Dirceu.

Naquele momento, Dirceu era o nome mais forte do governo e provável sucessor de Lula na presidência. Com a queda do homem forte do lulismo, a oposição pretendia instalar uma crise institucional com o objetivo de responsabilizar o próprio presidente Lula pela “corrupção generalizada” em Brasília, abrindo caminhos para o impeachment. Os grandes meios de comunicação entraram no jogo da direita e trataram de criar, entre a classe média, um clima de insatisfação que mesclava espanto, indignação e revolta. Felizmente, não conseguiram seu intento.

Para cassar os direitos políticos de Zé Dirceu, o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados armou uma farsa, com direito a cobertura ao vivo da Rede Globo e a presença de jornalistas de todo o País. O ministro de Lula enfrentou não um interrogatório justo e equilibrado, mas um verdadeiro Tribunal da Inquisição. Dirceu foi condenado sem que nada fosse provado contra ele, em uma das decisões mais absurdas da história da República.

Na noite de segunda-feira, Zé Dirceu foi o entrevistado do programa Roda Viva, na TV Cultura. Se alguém não sabia o que era bullying no jornalismo, teve um farto material para o estudo do caso. Assim como ocorreu no Conselho de Ética, Dirceu foi tratado, logo de saída, como culpado, e a presunção de inocência, um mero detalhe. Era preciso, após a vitória de Dilma, que os pitbulls da mídia descontassem a sua raiva em alguém. Quem melhor do que Zé Dirceu para ser o alvo da catarse reacionária?

Me chamou a atenção o despreparo dos entrevistadores. Principalmente Augusto Nunes, da Veja, que comprovou a superficialidade de seus argumentos. É muito fácil escrever desde seu protegido gabinete. Mas, no debate téte-téte, olho no olho, a coisa fica mais complicada para quem não tem conhecimento dos temas que aborda. Tendo a sua ignorância revelada ao vivo, apelou o tempo todo para a baixaria. Pudesse, saltaria ao pescoço do entrevistado.
.
Zé Dirceu se saiu muito bem, respondeu com firmeza aos ataques, desmontou facilmente acusações infundadas, não fugiu de perguntas polêmicas e colocou todos os patetas no bolso. Ficou evidente que aos jornalistas faltavam informações seguras e, em alguns casos, caráter.

À turma que o entrevistou restou apenas risos nervosos, caras e bocas de espanto, visível constrangimento e, provavelmente, uma puta ressaca no dia seguinte. Zé Dirceu foi brilhante do início ao fim, mostrou que a mentira nada pode contra a verdade dos fatos, jantou o fígado dos jornalistas e fez a sua defesa com a autoridade moral dos grandes injustiçados. A imprensa, mais uma vez, sofre fragoroso vexame. Dirceu sai engrandecido.

Vale a pena rever cada um dos blocos.

Bloco 1



Bloco 2



Bloco 3



Bloco 4

Nenhum comentário:

Postar um comentário